quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Sonha-vor


Se encontraram na beira da praia, e não havia melhor lugar para tão insólito encontro.

Ele chegou assobiando suas limitadas e tão apaixonantes notas. A brisa era fresca, suave, balançava as ondas e se esticava para perto deles. Quando ela olhou em sua direção, o assobio parou, dando lugar àquele sorriso que não passava de um brilho diferente nos olhos; riu um riso tímido, fazendo-lhe aparecer as covinhas próximas aos lábios.

Ela era eu e ele um pedaço do mundo, um pássaro – um ser alegre preso a sua liberdade, ave migratória, mudava com as estações. Não fosse por alguns detalhes ele seria como eu, eu como ele. Este alcançava o céu com as asas, eu com as ideias. Ele mal tocava o chão, mas quando o ar já lhe cansara as asas, era lá - na beira da praia, onde deixava um pouco de si na terra.

Nós beijávamos o sol, colhíamos estrelas, desenhávamos nuvens, viajávamos de sul a norte, do Brasil ao Japão, sabíamos como nos apaixonar pelo mar, sabíamos viajar, amar...

Sempre fomos pouco notados, pequenos demais no mundo. Na verdade, quanto mais alçávamos altura, mais parecíamos pequenos para aqueles que não se atreviam a voar.

Não importava como voávamos, importava aquele ar a nos encher os pulmões, nos dando ânimo para seguir viajem: uma nova rota, um novo destino, nada de mapas. Ele no céu, eu sintonizada com a gravidade do Planeta Azul.

[...] Continuar vivendo e como era bom viver.

Suas cores traziam-me felicidade, seu canto lembrava-me a textura gostosa das brincadeiras de criança, a sua liberdade lembrava-me de um amor dado sem medo por mim.

Tornamo-nos amigos de graça, fácil como me apaixonei pelo pôr do sol.

Ele sabia ser uma companhia agradável, sabia como conquistar corações...

Quando se acomodava em meu ombro, eu sabia que um mundo simplório me era suficiente, e que o que diferenciava um voador de um sonhador era um mero par de asas.

Eu amava aquelas tardes, amava saber que eu podia muito mais do que acreditava ser capaz, que eu podia conquistar a quem a liberdade conquistou, que eu podia brincar com o que parecia impossível, que eu podia voar...


[...] Eles passarão, eu passarinho. Mário Quintana